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Compras: é o fim do indicador de saving?

Nota ao Comprador: Se o objetivo principal do seu setor está diretamente ligado ao indicador de saving, algumas coisas precisam mudar. E logo!

Já dizia o poeta espanhol, Antônio Machado y Ruiz, “Só o tolo confunde valor com preço”. E, acredite, ao menos 90% das empresas tem cometido esse erro gravíssimo.

O saving é visto como um dos principais indicadores da área de Compras. Ele representa o quanto foi feito de economia e quanto de custo foi evitado. Exemplificando uma das formas de calcular o indicador: Você tem 3 propostas de fornecedores diferentes, sendo R$1300, R$1200 e R$1000. Se fechar por R$1000, quanto de saving obteve? Nada. Mas, se você fechar por R$900, garantiu 10% de economia. Ou seja, o saving não está no menor valor fornecido pelos vendedores, mas sim, no menor valor alcançado através da negociação.

No entanto, uma negociação deve levar em conta não só o preço, mas uma série de itens negociáveis. Alex Leite, Superintendente de Planejamento Educacional na Febracorp Live University, afirma que grande parte das empresas, no momento de decisão de compra, prioriza o preço e esquece-se da qualidade: “Por pressão de custo, os compradores acabam optando pelo fornecedor que, nem sempre, tem o melhor prazo ou, até mesmo, melhor qualidade. Ou seja, você tende a não privilegiar o que é bom para a empresa em detrimento, somente, do dinheiro que você vai economizar”.

É preciso dizer, também, que o exemplo de cálculo básico de saving acima foi bastante otimista. Numa negociação – ou renegociação – normalmente, você garante redução de, no máximo, 5% do valor final. Você sabia que essa porcentagem poderia ser muito maior?

É hora de pensar fora da caixa

Você é um comprador e trabalha com serviço logístico. Todo ano você precisa contratar transporte. Hoje, paga R$10 por quilômetro rodado – fazendo 100km/mês - e quer gastar menos que isso. O que você faz?

Segundo a métrica de saving, no momento de renovação de contrato com o fornecedor – vamos usar como exemplo hipotético a Julio Simões Logística (JSL) – temos de negociar um valor menor. Essa atitude garantiria, no máximo, uma redução de 5%, com a qual você pagaria R$9,50 ao invés dos R$10. É muito improvável pensar que uma empresa desse porte derrubaria, por exemplo, 30% do valor (de R$ 10 para R$ 7). Qual seria sua outra solução?

Você deve estar pensando: “Negociar com outro fornecedor de logística, oras”. Essa manobra também é uma estratégia do indicador de saving. Mas seria ela a melhor? A porcentagem de economia continuaria com uma margem muito baixa quando, na verdade, você poderia fazer algo muito mais efetivo: Pensar fora da caixa.

Alex afirma que pensar fora da caixa é parar de tomar decisões baseadas somente no indicador de saving e focar na rentabilização da empresa: “Eu costumo dizer que o indicador de saving é o câncer da área de compras. Em função, apenas, da economia, ele te impede de vislumbrar melhorias em performance. Pensar em rentabilização, em geração de receita, em melhoria do desempenho te faz buscar alternativas que promovem um ganho muito maior”.

Assim, seguindo a linha de pensamento, para ganhar mais dinheiro, ao invés de transportar 100km, porque não transportar 80km, por exemplo? Se você transportar 80km, ainda que pague os mesmos R$10 por quilômetro, ganharia 20% de desconto ao invés dos 5% provenientes da negociação.

Como isso é possível? E os 20km restantes? A resposta é simples: Você vai, pensando fora da caixa, procurar uma maneira de não fazê-los mais. Você pode estar pensando que isso é impossível, mas Alex afirma que não é: “Você parte do princípio de um transporte que você faz 3 vezes por semana com um caminhão 80% cheio. Se você utilizar algum sistema de gestão de carga – como cubagem, por exemplo – pode melhorar a performance para 98% cheio. Essa é uma solução que te ajudaria a reduzir a quilometragem, pois, ao invés de usar 3 caminhões 3 vezes na semana, você usaria apenas dois. Assim, derrubaria 1/3 do custo. Tudo isso porque você pensou numa solução matemática para consolidar a carga do caminhão”.

Alex vai mais longe: “Você também pode pensar: Será que eu preciso transportar? Pode parecer loucura – e talvez na maioria dos casos seja – mas é uma solução a ser considerada. De repente, você consegue não transportar uma parte do produto, investindo em produção local onde o cliente possa pegar. Já cogitou a hipótese de que o cliente pode preferir buscar o produto a pagar pelo preço alto do frete ou ter de ficar esperando prazos muito longos para receber a mercadoria?!”.

Case: Investindo em performance

 “O grande segredo é sempre pensar que o que está sendo feito hoje ainda não é a melhor maneira de se fazer”. É movido por esse raciocínio que, Claudio Marcos Ferreira, Head of Procurement na J Macedo e atual professor do Inbrasc, reúne-se, periodicamente, com pessoas de diferentes áreas, para debater e visualizar potenciais melhorias em sua organização.

Foi através de reuniões como esta na PepsiCo, onde era Senior Procurement Manager LATAM, que vislumbrou uma grande oportunidade de melhorias na performance e, consequentemente, no custo de um processo.

Analisando todos os impactos da cadeia e, não simplesmente, o custo de aquisição, Claudio, em conjunto com outras áreas, investiu esforços numa iniciativa de TCO – Total Cost Ownership – que analisou o custo final de uma embalagem de salgadinho. Esse estudo resultou em 3 projetos que ele explica a seguir:

“A primeira medida foi inserir um ingrediente na produção do filme (material) para que ele deslizasse melhor através do equipamento que dá forma à embalagem. Isso fez com que, em 1 hora de produção, nós ganhássemos 3% a mais de produtividade”. A segunda análise buscava oportunidades na questão da selagem do pacote. Toda embalagem precisa de um espaço extra, tanto na área superior, quanto na inferior, para que o equipamento consiga fazer o fechamento. Quanto maior este espaço, mais filme você gasta. Então, através do trabalho de TCO, analisamos quanto precisávamos investir em nossa máquina para que o processo de selagem fosse mais efetivo, utilizando uma área menor do material. Ao final, conseguimos reduzir o tamanho da embalagem em alguns milímetros, com um pequeno investimento. Além de reduzir o custo, passamos a depender de uma menor quantidade da matéria prima, o que é amigável ao meio ambiente. O terceiro projeto modificou o design da embalagem e gerou economia de custo. Ao invés de imprimir a cor principal do produto na frente e no verso do pacote – como era feito até então - percebemos que o verso poderia ser na cor original do filme – aquela cor prateada semelhante ao alumínio – apenas com os dizeres”.

Claudio ressalta: “A resistência natural à mudança dentro das organizações não deve impedir que você prove o quanto sua iniciativa será benéfica. É preciso mostrar que existe muito mais por trás de um projeto de produtividade, do que o valor da nota”.

Devemos descartar tudo que sabemos sobre saving?

Melhor do que dizer que é o fim do indicador de saving é dizer que é o fim da forma a qual o indicador de saving tem sido utilizado ao longo dos últimos anos.

Ainda que ele não deva ser o peso principal da tomada de decisão, o indicador de saving e suas métricas precisam existir. Nem sempre existe a possibilidade de aprimorar algum processo ou trocar o esquema de transporte. A grande questão é: o comprador precisa saber avaliar quando seu objetivo deve se basear neste indicador, bem como se há alternativas que lhe garantiriam maior rentabilidade.

Não preciso nem dizer que nada substitui a negociação, né?! Ela é e sempre será parte integrante de uma compra. Alex afirma: “As novas alternativas DEVEM ser negociadas. Você perderá dinheiro se não fizer isso. Não é porque eu já ganhei uma porcentagem maior de desconto que eu não vou brigar por mais. Unir as duas medidas maximiza os ganhos. O pouquinho que eu conseguir na negociação já gera uma mudança significativa no novo resultado”.

Pensando fora da caixa na prática

Antes de mais nada, é preciso dizer que você não precisa ser gerente ou diretor para idealizar e implementar novas soluções em sua empresa. Qualquer pessoa envolvida no setor pode enxergar uma brecha no processo e encontrar novas alternativas.

Alex conta: “Vou dar um exemplo de uma compradora, ex-aluna de MBA do Inbrasc, que chegou à aula super satisfeita dizendo que havia conseguido uma economia para a empresa a qual ela trabalhava: Sua companhia pediu para que ela comprasse mais alumínio e, como ela já havia comprado o material há alguns meses, pensou que teria restado algo. Ela ligou para a fábrica para perguntar se alguém sabia informar sobre sobras de alumínio. A pessoa responsável falou que não. Ela, então, ligou para outra fábrica e perguntou o mesmo. E, novamente, a resposta foi negativa. Ela não se deu por vencida e viajou até a fábrica para procurar pelas sobras. Chegando lá, começou a perguntar para pessoas que trabalhavam diretamente com o material. Só assim encontrou os vestígios de alumínio. No final das contas ela teve uma economia de 40%”.

Moral da história? Grandes cargos não obrigatoriamente têm acesso a todas as informações da cadeia. Com uma visão macro, um diretor, por exemplo, não enxerga problemas operacionais como, no caso, as sobras de alumínio da fábrica. A mudança veio da compradora que, vivenciando o problema, encontrou uma alternativa.

Aprenda a pensar fora da caixa e seja o responsável por grandes economias em sua empresa com o passo a passo a seguir:

1º Priorize as categorias com impacto maior no negócio

Feeling. Este fator rege a primeira etapa do processo. Num primeiro momento, é preciso observar os sinais de que algo diferente precisa – e pode – ser feito. Se você está há um bom tempo sem avanços significativos no indicador de saving de uma mesma categoria, significa que é o momento de mudar.

Mas, e se, após essa etapa, você perceber que 50 itens da sua empresa precisam de novas soluções?  A primeira coisa a fazer é se perguntar: Você consegue estudar os 50? Provavelmente não. Este é o momento de entender quantas categorias você consegue tocar em paralelo às funções do dia-a-dia, priorizando aquelas com maior potencial de rentabilização - as quais você tenha algum feeling de que novas soluções podem ser encontradas.

2° Estude profundamente cada categoria e encontre a solução

Não dá pra saber de antemão se vai ou não haver uma solução alternativa. Você só consegue descobrir se fizer uma profunda análise de cada item.

Para isso, melhor do que contar com longos relatórios cheios de tabelas, gráficos e figuras, produzidos por outras pessoas, “vá ao gemba!” Essa é uma expressão japonesa que significa “lugar onde as coisas acontecem”. Visite escritórios, linhas de produção, laboratórios de desenvolvimento de produtos e/ou centros de distribuição.

Aproxime-se da realidade dos profissionais dos setores os quais os itens são contemplados, entenda necessidades pontuais e, só assim, encontrará – se houver – uma solução alternativa. Lembra-se do caso da compradora citado acima?!

3º Negocie a nova solução com sua empresa

Em alguns casos – como o de Claudio na PepsiCo - você vai precisar da aprovação do seu gestor para poder implementar a nova solução. Em outros, além do seu gestor, o responsável por outra área que será impactada pela mudança.

Para isso, você terá de vender seu projeto. Estruture um processo de venda interna da nova ideia. Qual o problema encontrado? Quais áreas da empresa serão afetadas e quem vai se beneficiar com essa solução? Como? Qual o custo da implementação? São algumas das perguntas que devem ser respondidas no momento da apresentação do projeto.

Você pode saber mais sobre como planejar, estruturar e apresentar um novo projeto à sua empresa no workshop “Presentation: Transformando ideias em apresentações de negócios” oferecido pelo Ibramerc.

4º Implemente a solução

A última etapa do processo é a hora de pôr a mão na massa. Neste momento é importante ficar atento a duas questões importantíssimas. A primeira coisa é mapear as áreas afetadas. No caso dos exemplos citados acima - mudança de matéria-prima e compra de um software que faça a cubagem no caminhão - as soluções alternativas afetam não só o financeiro, mas a gestão operacional. Criar processos para as novas atividades é imprescindível.

A segunda questão envolve uma exigência que deve estar intrínseca a todo o processo: a busca pela satisfação do seu cliente final. Se você não souber exatamente os desejos e anseios de seu público alvo, nenhuma dessas alternativas será efetiva.

Pronto. Agora você está mais que preparado para fazer a diferença. Mãos à obra!

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